quinta-feira, 27 de maio de 2021

Nasce a AET-MG - Associação de Escalada Tradicional de Minas Gerais, uma instituição iniciada através de escaladores e montanhistas que vislumbram fomentar e organizar a escalada tradicional de forma colaborativa, com a participação da comunidade. Vamos juntos?

A boa convivência é um dos princípios da coletividade, desta forma, seguem as diretrizes da AET quanto a relação com a comunidade escaladora:

A AET nutre entre seus principais objetivos o de aproximar os escaladores das montanhas, os escaladores de sua comunidade, e; o escalador de si mesmo.

A AET acredita que assim numa mistura saudável de indivíduos com a natureza os valores humanos naturalmente eclodirão e evoluirão.

Motivada por esta crença e ciente da atual discussão sobre a "mudança de postura na escalada", a AET se posiciona da seguinte forma perante seus associados e entusiastas:

- que, seguindo uma tradição tão custosa e valorosa para aqueles que dedicaram a sua vida à construção daquilo que hoje se entende como "escalada" em suas várias vertentes; sugere-se que toda e qualquer mudança numa via ou rota seja respeitosamente discutida entre a figura do interessado e do conquistador, e que a decisão tomada pelo conquistador seja aceita no sentido mais amplo da palavra, inclusive se a sua vontade for a de não discutir o assunto;

- que, os tão comuns adjetivos da polarização política não invadam o nosso ambiente de montanha e não povoem as nossas discussões, pois a pacificação dos contrastes entre os pontos de vista é, sem dúvida, expressão do respeito ao exercício da mais pura liberdade individual;

- que, as redes sociais não sejam o palco para estas discussões, pois tendem ao acaloramento dos ânimos e ao conflito público desrespeitoso entre ou para com aqueles que tanto fizeram, que tanto estimamos e que tanto admiramos. Os clubes e as associações são o fórum ideal para firmar consenso entre as partes.

Enfim, a AET deseja que restem das decisões as amizades e a evolução das idéias, evolução esta que empreende transformar o futuro a partir dos erros reconhecidos do passado e também de novas perspectivas vindas das gerações mais novas, sempre com diálogo e respeito.

As reuniões da AET são abertas para qualquer interessado, venha conhecer as nossas ações e projetos, a transparência de nossas propostas é que garante a colaboração de todos.


https://www.instagram.com/aet_mg/

sexta-feira, 29 de maio de 2020

Sociedade Alternativa 6° Vll (A1/7c) E3 650m - Relato de Rander Ferreira



Desde a minha primeira investida no Pico do Baiano em 2019 pela via Obra do
Acaso 5+ Vl (A0/7C) E2, na qual infelizmente não fizemos cume, carrego uma vontade
de voltar ao Baiano. Essa primeira investida foi muito intensa, meu grande amigo
ROBIN machucou o ombro na P2 e não pudemos concluir a escalada. Horas depois
começou uma forte chuva e, por causa do acidente, não pegamos essa roubada na
parede.

No início deste ano, meu amigo André Machado (Dedão) me convidou para
escalar o Pico do Baiano com o seu amigo Henriquinho, mas dessa vez pela via
Sociedade Alternativa, conquistada pelos grandes escaladores Marcos Rufino e
Gustavo Pietsch (Tigrão) em 2011. Eu fiquei muito ansioso com o convite pois sabia
que aquela era a minha chance de finalmente realizar o meu sonho: escalar o Pico do
Baiano por completo.

No dia seguinte, comecei a arrumar os meus equipamentos de escalada e
camping para este grande feito. A ideia do André era saírem às 15h de Belo Horizonte,
mas aconteceram alguns imprevistos que acabaram atrasando a vinda deles. Ás 20:30
ele me mandou uma mensagem avisando que estava saindo de Belo Horizonte, 2h30
depois ele chegou em Catas Altas para me pegar no trevo. Nesse meio tempo, eu
estava muito ansioso e tentava de todas formas controlar esta ansiedade.
Fomos para o Morro d’Água Quente. 23h começamos a ajeitar algumas coisas e
partimos para a trilha. Percorremos aproximadamente 1h30 de trilha bem fechada até
o primeiro abrigo. Chegamos no abrigo quase 1h da manhã, esse atraso resultou em
poucas horas de sono, 3h30 aproximadamente. Acordamos às 5h da manhã. Acordei
bem cansado, poucas horas de sono para muitas horas de atividade é bem cansativo.
Estava frio e a primeira missão do dia era sair do saco de dormir, bem desanimador,
né?
Tomamos aquele café de montanha, “sem açúcar e bem forte’’, para dar
alguma energia naquele momento. Depois do café, ajeitamos os equipamentos e
partimos para o ataque à base da via. Começamos a caminhada entre 6:30 e 7h da
manhã. Foi uma caminhada muito árdua que durou 2h. O primeiro desafio de escalar o
Pico do Baiano é encarar a trilha. Chegamos na base da via um pouco cansados, porém
com muita disposição para encarar a “onça”. Já eram quase 9h da manhã, bem tarde
para iniciar uma escalada no Pico do Baiano. Nesse momento, sabíamos que alguma
atividade seria feita durante a noite fria que nos aguardava. Novamente ajeitamos os
equipamentos, comemos mais um rango e bora para o tão sonhado cume...



André Machado (Dedão) guiando a primeira cordada


Começamos a escalar 10h, às 10:30 estávamos na P1 da via. A logística era a
seguinte: o André guiaria todas as cordadas, sua experiência nas grandes paredes fez
toda a diferença; já eu e o Henriquinho iríamos alternando entre escalar e jumarear
para ganharmos tempo. Fiz a seg da primeira cordada e logo em seguida escalei. No
meu primeiro contato com a via, senti uma forte energia e ligação presente, ali era o
meu momento, foi uma mistura de adrenalina, coragem e determinação para encarar
a “onça”. Logo em seguida veio o Henriquinho jumareando parede acima com uma
mochila pesada.

A média era 1h a cada 2 cordadas e assim foi até a P5. Estávamos com 2 cordas
de 60m mas no croqui pedia uma corda de 70m. Aí veio o problema: entre a P4 e a P5,
a corda de 70m faria toda diferença. Era uma enfiada com um pouco mais de 60m e a
corda não ia dar até a parada da P5. André teve que improvisar uma parada e subimos
até quase o final da P5. Logo em seguida, ele já começou a tocar para cima e, acima da
P5, o André entrou em uma roubada. Segundo ele, era uma linda fenda, mas um pouco
podre e com proteções delicadas. Além disso, a corda de 60m também não daria
comprimento até a P6. Logo acima dessa fenda, tinha uma outra fenda mais larga e um
pequeno platô. Mais uma vez rolou uma improvisada que deu muito certo, mas dessa
vez foi uma parada móvel com 4 peças “a prova de bombas”. Me lembro que foram
usados Camalots 3 e 4 na fenda mais larga.

Nesta enfiada, o Henriquinho foi escalando até o André. Logo em seguida,
André tocou pra cima pra chegar na P6. Fiquei esperando na P5 improvisada até o
André chegar na P6 e depois fui jumareando pela corda fixa nas peças móveis
(confesso que foi um pouco drenante, eu não sabia como estavam as peças lá, mas
entreguei a minha vida nessa parada aprova de bombas e toquei pra cima). Foi
incrível! Tive toda confiança no André pela sua experiência e capacidade de lidar com
as adversidades, então fiquei muito tranquilo logo após essa adrenalina toda.

Chegando nas proteções delicadas, eu não me lembro o que fiz, mas acabei
deixando um mosquetão cair. Ele ficou a 3m de mim em uma pequena fenda na
horizontal. Tentei de várias formas para recuperar este mosquetão mas eu não
conseguia alcançá-lo, eu estava preso no jumar e não conseguia descer: falta de
experiência. Perdi um tempo precioso tentando recuperar o mosquetão, decidi, então,
continuar subindo e deixar o mosquetão de lado. Cheguei na parada móvel e o
Henriquinho estava lá me esperando. Após trocarmos uma rápida ideia ele foi buscar o
meu mosquetão. Eu não queria que ele fosse porque iríamos perder mais tempo, mas
ele desceu, recuperou o meu mosquetão e subiu jumareando.


Detalhe da Parada em Móvel “Pra cego ver, corda azul fixada nos Camalot número 3 e 4, camalot é essa peça entalada na fenda, na corda o meu julmar esse equipamento dourado que serve para fazer ascensão “

Henriquinho indo buscar o “maldito” mosquetão Linda paisagem né? Pico do Baiano sempre surpreende...  


Chegamos na P6, o André ficou um pouco intrigado com o que tinha
acontecido, mas essa demora fez com ele pudesse dar uma descansada e logo partir
para a próxima roubada. Dei a ele uma sanduiche para recuperar as energias e bora
pra cima! Cerca de 2m da parada da P6, havia um lance em artificial com um buraco de
cliff camuflado, o André colocou o cliff com um estribo no buraco e subiu. Acima dele,
havia uma mini barriga com uma linda fenda em cima, foi um momento de tensão
porque a qualquer momento o buraco do cliff poderia estourar e ele cair. Logo após
ficar em pé no estribo, ele colocou 2 peças de camalot na fenda e tocou pra cima - a
experiência necessária para guiar esta via foi muito mais além do que eu imaginava.
Ver essa cena foi incrível para mim, vi muita experiência e um psicológico a prova de
bombas no André (rsrs).




Após essas roubadas, as cordas foram fixadas na P7 e eu e o Henriquinho
subimos com tudo para não perder mais tempo. Chegamos na P7, mesmo com a corda
fixa e totalmente preso nela, eu senti a exposição daquele lugar como nunca. Eram
lances fáceis pelo o que vi, mas era muito exposto cair ali. Poderia ser fatal, mas a
grande jogada mental faz toda a diferença, se manter calmo e consciente é a única
saída.

Chegamos na P7 às 17:35h, tarde, faltava mais 5 cordadas para o cume, mas
dali para cima era mais tranquilo. A via Sociedade Alternativa se encontra com a Obra
do Acaso nas 5 últimas enfiadas - as mais expostas, porém bem fáceis. Eu e o
Henriquinho subimos jumareando para ser mais rápidos, já estava anoitecendo e
sabíamos que iriamos escalar durante a noite. Chegamos na P10 bem rápido, o André
foi guiando e encontrou a P11. Depois, decidimos ir escalando em simultâneo até uma
parte e o André encontrou a P12 (detalhe, eu e o Henriquinho escalamos de botas
rsrs). André gritou “Corda fixa” e subimos com tudo, sabíamos que era a última para o
cume.

CUME PICO DO BAIANO E RAPEL

Chegamos ao cume às 19:40h. Para mim, o meu sonho tinha sido realizado
naquele momento, alcancei o meu objetivo: chegar ao cume do Pico do Baiano por
uma via de escalada. Foi muito mais especial ainda porque escalamos uma via que não
tem muitas repetições como a Obra do Acaso, a via mais repetida no Baiano. No cume,
assinamos o livro e comemos uma caixa de bombom patrocinada pelo André que
estava uma delícia. Um outro presente que foi muito marcante era o nascer da lua, ela
estava meio avermelhada, estava linda! Conforme ela subia, ela iluminava mais ainda a
parede! O frio e o vento cortava na alta, era difícil parar com a tremedeira, “estava
osso”. Mesmo assim, ficamos um tempo no cume para comemorar tal feito histórico.

Após a comemoração, era a hora do rapel. Chegando na beira do paredão, o
vento ficava ainda mais forte. Eu tremia tanto que o meu peito começou a doer
bastante, foi difícil, fiquei todo travado. O Henriquinho estava de bermuda, acredito
que ele passou mais frio do que eu rsrs. Começamos os rapéis umas 21h e fomos
rapelando pela via Obra do Acaso, que esta paralela a 20m da Sociedade Alternativa (é
um rapel mais fácil, mais reto, etc...). Foram cerca de 2:30 a 3h de rapel. 00h,
chegamos a base da via.

Bônus da noite, a lua iluminava toda parede cinza e branca do Pico do Baiano e
o horizonte, em alguns momentos eu não usava a headlamp (lanterna de cabeça),
estava muito claro, era possível ver a altura que ainda estávamos, era bem alto,
famosa “ Pirambeira ”, linda, visual que só o caraça pode proporcionar. Em alguns
momentos eu fechava os meu olhos e percebia o quanto estava cansado, Henriquinho
 fazia o mesmo, estávamos “ mortos “, após esse rapel chegamos a base, a missão
estava feita!

Não tínhamos tempo para comemorar, ajeitamos os equipamentos e pegamos
a árdua trilha. Essa para mim foi a pior parte de toda empreitada, 2h de caminhada até
o primeiro abrigo. Eu estava andando no automático, muito sono, muito mesmo, em
alguns momentos dava vontade de sentar e levantar só no outro dia. Ficamos
exaustos, o Baiano destrói o físico e o psicológico, tem que ser “CASCA GROSSA”, se
não, não arruma nada ali. Chegamos ao abrigo ás 2:30 da manhã, completamente
destruídos. Fizemos uma breve janta: arroz sem sal, 1 cenoura e um pedaço de
linguiça. Comemos, comemoramos mais um pouco e fomos ao merecido descanso.

Uma das maiores experiências de minha vida! Cada um ali saiu com sua
realização: eu realizei o meu sonho de escalar o Pico do Baiano por completo, o André
realizou o seu sonho de guiar todas as cordadas no Baiano e Henriquinho finalmente
terminou uma escalada no pico - assim como eu, a primeira investida não deu certo,
mas ele voltou depois de 10 anos.

Cada um foi responsável pelo o outro, foi uma verdadeira reunião entre
amigos. Conheci o André pelo Instagram e tive essa oportunidade incrível de escalar
com essa máquina, valeu pela confiança meu brother, tamo junto!! Conheci o
Henriquinho no trevo de Catas Altas um dia antes da grande escalada... Seremos
parceiros pro resto da vida! A magia da montanha tem esse poder de conectar as
pessoas para sempre.

Obrigado aos meus amigos e familiares pelo apoio, isso é muito importante
para mim. Ao meu irmão Ramon, agradeço de coração pela parceria. Na primeira vez,
não fizemos o cume, mas dessa vez eu fiz o cume por você também, pelo Robin, pela
Clara, por todos os meus amigos, meu mozão < 3 e claro, POR MIM! Até a próxima!


Auuuuuuuuuuuuuu!!!!

EU RANDER FERREIRA SILVA JUNIOR SOU O PRIMEIRO

ESCALADOR DE CATAS ALTAS NATIVO DA SERRA DO

CARAÇA E TALVEZ DESSA GERAÇÃO A ESCALAR O

PICO DO BAIANO...


Clássica foto na parada, Sociedade Alternativa, fez muito sentido o nome...




Henriquinho na seg, detalhe do pico do tamanduá ao fundo...



Lindo visual que o caraça e o Pico do Baiano proporcionam.



 O pequeno distrito do Morro D’Água Quente de um ângulo completamente diferente



André ajeitando a calça, foto desfocada mas tá valendo


Grande rampa em um trecho da P5


Só os “Caracentos”, felicidade é igual esse tanto de mato que tem ai


Detalhe da via


CROQUI DA VIA,FIM...

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

O verão chegou e com ele inúmeras atrações como praias, botecos, bloquinhos de carnaval, cervejas, mulheres e...    cadê a escalada?

Podemos nos deparar com esta situação neste período, principalmente para os ratos de pedra, pois as academias que são designadas para suprir esta demanda, não atendem aos que se dedicam a atividade pelo simples fato de se situar em meio a natureza e a todos os seus agentes incluindo o desconforto, a falta de recursos e principalmente os riscos envolvidos em uma atividade ao ar livre.

Além da chuva incessante ser característica do verão, outro fator que acaba incomodando é os intervalos de sol, que ao surgir em meio as nuvens, vem com toda a sua potência e traz temperaturas que podem trazer consequências graves como insolação, desidratação e até queimaduras na pele.
Infelizmente a maioria das formações rochosas, principalmente as que tornam possível a escalada fracionada ou de cordadas, são suscetíveis a exposição direta as chuvas, impossibilitando a escalada livre, pois as reentrâncias na rocha acabam se encharcando, tornando as agarras totalmente escorregadias. Neste caso temos que procurar as poucas rochas que por suas características protegem uma parede escalável da exposição das chuvas, e como Minas é o mar de montanhas, somos privilegiados com alguns picos e várias possibilidades em um raio de 100 km no entorno de Belo Horizonte.

Citarei aqui apenas os picos que já se encontram consolidados para a escalada, pois infelizmente não há mais respeito perante a natureza, e por incrível que pareça, das pessoas que dependem dela para realizarem suas atividades...
1 – Serra de Ita-maranhen (serra das Cambotas) – representa um elo entre a escalada esportiva, vias de cordada e escalada de aventura, tudo isso concentrado em cerca de trezentos metros de base com cerca de duzentos e cinquenta metros de altura, sendo em sua maioria grandes negativos, e têm escaladas que variam desde o sexto até o décimo graus e que vão dos oito até os 250 metros de altura, tudo isso em um quartzito macio e extremamente aderente.














2 – Pedra Vermelha – Localizada no distrito de Socorro, pertencente a cidade de Barão de Cocais – se assemelha a uma grande onda e foi fonte de inspiração para a denominação das vias, tais como tsunami, waimea e tormentos e foi palco de grandes escaladores que aumentaram consideravelmente o numero de vias no pico, principalmente as de alta performance – força e técnica exigentes
3 – Sala de justiça – serra do cipó G3 – Considerado a Meca da escalada esportiva no Brasil, reúne inúmeras vias de escalada em um pequeno ponto geográfico, sendo que as vias específicas deste setor são reconhecidas a nível mundial e recebem todos os anos grandes nomes da escalada esportiva sejam eles do Brasil ou não.
4 - Pedra Romana – Localizada a beira da estrada que liga a serra do cipó a conceição do mato dentro é uma bela formação rochosa com vias de alto nível, porém há relatos de acidentes com abelhas sendo necessária atenção redobrada

5 - Setor Gandarela (Cocais) – Formação específica em propriedade particular, ainda não há previsão de abertura

6 - Serra do Garimpo – Localizada acima da serra de Cambotas, tem uma via peculiar, que se localiza no abrigo andorinhão

7 - Sítio do Rod – algumas vias no ultimo setor, somente se não tiver chuva de vento

8 - Cachoeira alta (Ipoema) – várias vias localizadas na face rochosa a direita da cachoeira, acesso as vias se dá por uma árvore “tritronco” a partir da trilha principal


9 - Serra da Lapa (Itambé do mato dentro) – face rochosa vista a partir da estrada de acesso a Itambé, há também outra formação conhecida como conquista e tem o setor “Sinhá” que conta com duas vias esportivas.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Escalada em Pedra Azul

Desperto abruptamente devido a claridade que invade o ambiente, sinto um pequeno incômodo e logo me levanto para aliviar aquela tensão causada pelos inúmeros copos de cerveja ingeridos na noite anterior. Após me sentir um pouco melhor, busco na paisagem através da janela um sinal de estabilidade, este que já esperávamos há alguns dias, sucumbindo impiedosamente ao legado destacado na região, composto do fermentado da garapa destilado, mais conhecido como cachaça, que impera na economia local. Observando a nebulosidade presente em toda a extensão do céu, não hesitei em comentar com os amigos ali presentes, dos quais imaginei que estariam embriagados pela sonolência, mas que se mostraram ativos logo na primeira reação.

-“Se for pra ir vai ser agora!”

Foi a primeira resposta que ouvimos, visto que o horário já se mostrava adiantado, eram por volta de onze horas da manhã e ainda tínhamos cerca de duzentos quilômetros de estrada para chegar ao nosso destino, estas que estavam desgastadas, resultado de chuvas ininterruptas em um caminho que há muito não recebe manutenção adequada, aliás sequer tem uma estrutura aceitável, uma estrada de terra com inúmeros buracos, depressões, poças d’água e barro, seqüenciada por uma estrada asfaltada e bem sinalizada porém comandada por carretas gigantes, estas que vão até os trinta metros de extensão. Ainda em Taiobeiras procuramos alguns itens que ainda faltavam em nossas bagagens, como a chave de boca e a marreta, indispensáveis para a conquista e algo para forrar o estômago, já que alimentar era fora de cogitação, visto que a noitada anterior rejeitou uma ingestão apropriada àquela atividade que estávamos nos preparando.

Depois de um bom trecho de estradas começamos a visualizar os gigantes maciços rochosos, a iniciar por uma bela formação em Medina e muitas outras na chegada de nosso destino, a bucólica cidade de Pedra Azul. Como nosso horário era curto, decidimos sequer contemplar aquela bela paisagem e fomos diretamente ao Forno de Bolo, destacado por parecer fielmente ao seu homônimo, e emoldura este fantástico município provedor de um dos mitos da cultura musical brasileira.

A caminhada até a rocha foi um pouco morosa, no entanto por volta das três horas da tarde estávamos na base da via, onde existe uma seta caracterizando o rumo a tomar para se alcançar a primeira chapeleta e rapidamente iniciamos a escalada. As três primeiras cordadas, conquistadas anteriormente pelos companheiros Fabinho e Luzinha são mais expostas porém muito fáceis, mas ao chegarmos na P3, nos deparamos com uma “barriga” desprovida de agarras e a partir daí a conquista passou a ser um misto de artificial e livre, encadeados depois pelo companheiro Fabinho, que a graduou em 7c predominando o sexto grau. Na P4 surgiu outro problema, as macambiras que espetavam as nossas mãos a cada agarra que usávamos predominava acima desta parada, daí o Fabinho tomou frente e encarou o desafio de “abrir espinho no peito” e após um belo lance de fendas e diedros acabou encontrando um grampo “P” onde vimos que a via se encontra com outra próxima ao cume, mas mesmo pesquisando não achei nenhuma informação sobre esta via. Subindo costão acima e um filhote de jararaca no meio da via, batemos mais uma parada dupla e pouco após mais outro grampo, mais trinta metros acima e CUME! Isso já eram por volta de oito e meia da noite e após uma pequena comemoração e registro no livro, iniciamos os rapéis, caracterizados pela má escolha nossa dos equipamentos e acabamos sendo prejudicados por uma corda estática de cem metros que torcia cada vez mais a cada descida e formava um “bolo” complexo de desembolar, e chegamos ao chão somente por volta de uma da manhã!

Após forrar o estômago em Pedra Azul pegamos estrada para Taiobeiras, onde chegamos por volta de cinco da matina e finalmente podíamos descansar!! Saudações a família Pires e Santana, por nos acolherem nesta aconchegante cidade e aos parceiros Luzinha e Fabinho, por persistirem a voltar neste belo monumento natural do qual este grandioso estado de Minas dispõe!
 A imponente cabeça torta
 Cordada da barriga, graduada em 7c
 Fita abandonada para rapel
 Detalhe da corda estática "dos infernos" que se tornou uma bololância impossível de desembolar
 ART
 A rocha, um misto de macambiras e pedras soltas
 arrumando os equipos
 3a cordada da via, cordada fácil, porém exposta
 Comemorando o CUME!
 No caminho de Pedra Azul, só alegria
 Rodovia estadual
 travessia do brejo
 Forno de bolo, a via segue a esquerda da grande canaleta
 Livro de cume
 Forno de bolo com a rodovia de acesso a Pedra Azul ao fundo
 E a chuva nos acompanhava incessantemente
Fabinho "perrengando" no crux da via
Via Padre Iluminando a Vela Face Leste do Forno de Bolo IV 7A (7C/A1) E3 D2 335 mts + costão

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Escalada na Pedra Riscada, via Moonwalker

Depois de uma semana conturbada me recuperando do grande feito de chegar duas vezes ao cume do baiano em um único fim-de-semana, me preparo para mais uma grande aventura neste belo estado de Minas Gerais. A convite do parceiro André Dedão (filhão) e do Guilherme Binha (Leopoldina), resolvemos ir à pedra Riscada, em São José do Divino, repetir a via Moonwalker 5º VI+ E3 D5, esta que eu havia escalado recentemente mas ainda relutava em querer escalar as cordadas das quais eu não entrei.

Na sexta-feira reunimos na residência do Dedão e após uma breve reunião regada a pizza e refri iniciamos a jornada de viajar cerca de 450 km rumo ao leste mineiro, que detém um mar de montanhas, onde se destacam inúmeras ilhas de granito, grandes formações rochosas geralmente em formato oval, denominados “inselberg’s” e entre eles há um que se destaca: a Pedra Riscada, referência internacional de escalada de grandes vias do Brasil. Começamos na estrada por volta das 22 horas com o pessoal se revezando no volante e chegamos por volta de 6 e meia da manhã, indo diretamente à padaria rechear as panças para executar o ofício do dia. Por volta de 9 horas chegamos à base da via, que têm como referência uma embaúba e iniciamos os procedimentos de separar os equipamentos e tralhas que deveriam subir conosco.

O Dedão já de cara iniciou a escalada, ele que foi um dos que começaram a conquistar esta bela via estava ansioso para repetí-la e não hesitou em fazê-lo o mais rápido possível devido a necessidade cumprir o horário, principalmente porque estávamos em três. Estas primeiras cordadas são tranqüilas, todas bem protegidas e não passando do quinto grau, passando por dentro de uma canaleta e desviando para um costão até se chegar ao “platô bão”, neste local aproveitamos para fazer um pequeno lanche e recarregar as baterias, mas nada que durasse acima de dez minutos porque já eram por volta de 14:15 e ainda haviam cinco cordadas (cerca de 250 metros acima) para mandar até chegar no platô de bivaque, este que seria o nosso local de descanso. A partir daí pega-se outra sequência de canaletas, porém um pouco mais técnicas e a saída para um costão de 5º grau, porém bem exposto, mais duas cordadas acima e finalmente chegamos no referido platô, que é caracterizado por ser uma mata e ali foram trabalhadas algumas contenções, favorecendo maior conforto para o repouso noturno. Ali fizemos uma bela gororoba e após a sobremesa nos acomodamos para o tão esperado descanso, isto por volta de 19:30 hs.

Ao amanhecer a primeira visão do dia foi visualizar a bela pirâmide que se forma acima do platô, ela se encontrava encoberta pela neblina densa, e durante alguns poucos intervalos era possível ver que a medida que se ganha altura, a parede se torna mais íngreme, caracterizando trechos verticais, tornando mais desafiante o intuito de chegar ao cume. Fizemos um rápido café-da-manhã e o Dedão novamente tomou frente na guiada e a partir disso fomos revezando novamente parede acima, agora estávamos bem mais ágeis, devido ao descanso efetivado e ao entrosamento da logística das paradas, o que no dia anterior onerou um bom tempo. Poucas cordadas acima a via se junta com a Esmurgator e mais acima outra via, esta caracterizada por ser composta de chapeletas gringas (aço inox), a partir daí mesmo utilizando as proteções das três vias as duas últimas enfiadas são mais expostas e como existe a possibilidade de se escalar pela variante (onde se concentra o mato) acabamos optando seguir por este caminho, mas é importante saber que a parada final é constituída por uma canela-de-ema, onde os participantes devem evitar ao máximo se dependurar na mesma, usando somente do próprio esforço para superar esta cordada, ou seja, não jumarear! Ali comemoramos mais uma vez com o chocolate do cume e depois de tirar umas fotos e chegar na parada fixa pouco acima começamos a rapelar o mais rápido possível tentando aproveitar ao máximo a luz natural. Começamos a descer por volta de 12:15 hs e alcançamos o chão às 19:30 hs, tempo suficiente para procurar ainda um local para poder dormir e continuar viagem rumo a BH.


Agradeço aos parceiros pela coragem e vontade de superar cada desafio, e muito mais por proporcionarem a diversão, essencial para o sucesso desta aventura, ao Sr. Edimílson Duarte, por sempre estar incentivando a prática de montanhismo no município de São José do Divino e a DEUS por nos conduzir a esta aventura e dispor tamanha beleza neste maravilhoso estado.
 Croqui da via moonwalker
 Na P4, canaleta extensa
 Pedra da Baiana, no município de Nova Belém, vista a partir da Riscada
 Guilherme Binha e o início da grande canaleta
 André Dedão, Guilherme Binha e Thunder no começo da trilha
 Rapelando nas canaletas
 No cume! detalhe da calena-de-ema
 Na P1, o detalhe da embaúba como referência da base da via
 "Inselberg's", as ilhas de granito
 A pirâmide encoberta pela neblina
 Chegando na P13, o bivaque é nessa matinha, logo abaixo
 Chegando na base, após 7 horas fazendo rapel
 Bivaque, pra quem quer conforto, carrega peso!
 panorâmica
 Quase todas as paradas são duplas
 Dedão entrando na primeira cordada
 Mata densa
Pôr-do-sol